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Teatral-Mente Opinando 21 | Mil estrelas a cantarem a história do Casino Estoril


Salão Preto e Prata - Casino Estoril. 13 de Junho de 2015 (17h). Meia sala.

A Noite das Mil Estrelas é anunciado como o melhor espectáculo de sempre apresentado no Casino Estoril... Injustificadamente!
Não se impõe por qualquer prodígio de originalidade o musical que La Féria estreou no passado mês de Abril no luxuoso Salão Preto e Prata daquele que é considerado o maior Casino da Europa e que tem agora a sua história contada em palco. Entre luzes, plumas, bailados, brilhos e um chorrilho de canções - por vezes mal "enlaçadas" - vamos assistindo à pouco imaginativa narração da história de um dos pontos mais emblemáticos da linha, desde os tempos em que o Estoril era ainda uma zona despovoada e desinteressante, que deu a Fausto Figueiredo a oportunidade de concretizar o sonho de transformar as zona num dos principais pólos de atracção do país, até à época em que as maiores estrelas nacionais e internacionais fazem as delícias do público. 
Alexandra é a estrela principal nesta constelação e prova continuar em plena forma, dedicada e sempre jovem, desdobrando-se em figuras como Elis Regina, Nina Simone, Gloria Swanson ou a inevitável Amália, já mais que colada à pele da cantora. Em todas as intervenções arrecada calorosas ovações de uma plateia que a acarinha e admira o seu talento e entrega. A seu lado, o público encontra Gonçalo Salgueiro, que tem a sua coroa de glória ao encarnar António Variações, entre outros conseguidos momentos (onde não se pode incluir a interpretação de "No Teu Poema"), ou Pedro Bargado, que é sinónimo de talento bruto e dedicação desmedida, que se reflectem em cada aparição, cada qual mais extraordinária que a anterior e todas elas justamente premiadas pelo público com estrondosos bravos e aplausos. 
Mas a estrela mais fulgente é, sem sombra de dúvida, Vanessa. A pequena grande musa de La Féria é brilhante em todas as suas intervenções e a sua bonita e alegre presença, por si só, vale a ida até ao Estoril. O seu Charleston é vibrantemente empolgante, a sua Liza Minnelli é admirável na energia e poder vocal, tal como a figura pede, mas a sua Maysa é absolutamente arrebatadora e arrecada o galardão para o momento alto do espectáculo, numa emocionante interpretação de "Hino ao Amor".
De regresso aos musicais está também Rui Andrade, que, sem alardes ou novidades - alheias à sua responsabilidade - , continua a firmar o seu nome na plêiade das grandes vozes nacionais. Dora é outro dos grandes regressos. A eterna intérprete de "Não sejas mau para mim" ganha o público com a sua já badalada potência vocal e com a simpatia e elegância que imprime no trabalho que lhe distribuíram, merecendo, claramente, outros voos mais altos.
João Frizza é, por assim dizer, o "cómico de situação" e cumpre a função sem mácula, desempenhando com graça natural os papéis que lhe foram atribuídos. A completar o elenco contam-se ainda os nomes de David Ripado - que surpreende numa gloriosa interpretação de "La Bohème" e completa a galeria de momentos conseguidos com a recriação de Chico Buarque - , Cláudia Soares - que, depois de tantas provas dadas em anteriores produções, merecia já outro tipo de trabalho onde pudesse destacar devidamente todo o seu potencial, apesar de ter uma muito aplaudida intervenção ao dar vida a Maria Bethânia - e Catarina Mouro - jovem lírica, de assinalável talento, que começa a dar os primeiros passos dos muitos que, certamente, lhe estarão destinados. 
Plasticamente, a peça apresentada no Salão Preto e Prata tem algumas assinaláveis criações de muito bom gosto, no que diz respeito ao guarda-roupa (idealizado pelo Mestre José Costa Reis), mas peca por um duvidoso desenho de luz que, por vezes, não joga correctamente com as cores escolhidas para os figurinos e não valoriza a fraca cenografia, da autoria do próprio La Féria. Para abrilhantar est'A Noite das Mil Estrelas, Marco Mercier coreografou um jovem Corpo de Baile, que cumpre com jovialidade e desenvoltura o proposto, apesar de a coreografia ser fraca - salvo alguns momentos como, por exemplo, "Venham ao Casino" -, comparada às criações do jovem e talentoso coreógrafo em anteriores produções, como é o caso da"Grande Revista à Portuguesa". A completar a equipa, existe ainda uma luxuosa orquestra, dirigida com mestria por Telmo Lopes e merecedora de fortes elogios, e um grupo de três grandiosos e profissionalíssimos acrobatas (Mónica Alves, Bruno Rosa e Miguel Tira-Picos), elementos essenciais no conjunto. 
De destacar, negativamente, algumas falhas na dramaturgia, onde se contam erros, por exemplo, na introdução à actuação de "Maysa" (onde é referido que a cantora acaba de perder o seu marido, que, na realidade, na altura era já seu ex-marido) e na despropositada ligação ao número do "Rei Leão". Para além disso, um ponto mais que negativo no musical é o facto de o encenador ter reutilizado um dos momentos musicais mais bem conseguidos de um anterior espectáculo (a abertura "Lisboa", da Grande Revista à Portuguesa), atribuindo-lhe uma nova letra de qualidade muito duvidosa.
Em suma, A Noite das Mil Estrelas está muito longe de ser um dos mais inspirados espectáculos de apresentados pelo rei dos musicais em português, apesar de toda a pompa que o rodeou, mas, apesar de todas as muitas falhas e da mais que evidente falta de originalidade, merece, por alguns motivos e pelo talento dos elementos envolvidos, alguns sorrisos e aplausos do público. · A Noite das Mil Estrelas > Texto, cenografia, música e enc. de Filipe La Féria; figurinos de José Costa Reis; coreografia de Marco Mercier; produção de Boca de Cena, Lda.; com Alexandra, Vanessa, Pedro Bargado, Dora, Rui Andrade, Gonçalo Salgueiro, João Frizza, David Ripado, Cláudia Soares, Catarina Mouro e, em algumas sessões, Inês Herédia. Salão Preto e Prata do Casino Estoril; Avenida Dr. Stanley Ho, Estoril; T.210 135 050. Qui-Sáb. às 21h30 e Sáb e Dom. às 17h. 10€ a 35€.

Nota: Em alguns espectáculos, toma parte no elenco a cantora Inês Herédia, em substituição de Vanessa. Certo é que substituir Vanessa em qualquer que seja a sua personagem é uma árdua tarefa. Inês Herédia descolou-se da figura "original" e compôs as figuras à sua medida, numa correcta escolha. Apesar do esforço e do trabalho evidente, perde pontos para Vanessa, mas marca a cena, quanto baste, pela jovialidade e pela doce voz, merecendo os aplausos e a simpatia do público. (Com base na sua prestação no espectáculo de 02 de Maio de 2015)